CARTA ABERTA AO PODER PÚBLICO



Atualmente, entidades brasileiras como a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) e o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) tem se manifestado contra o plágio acadêmico e a favor da ética na pesquisa (1).[1]

Foi neste contexto que foi realizado o II BRISPE (Encontro Brasileiro de Integridade em Pesquisa, Ética na Ciência e em Publicações) em final de maio, início de junho deste ano, onde pesquisadores do Brasil e do exterior debateram vários temas relacionados ao assunto (2).[2]

Provavelmente, sob a influência destas manifestações, são inúmeros os textos recentemente publicados sobre o tema, além do aumento da pena para os casos de plágio conforme notícia publicada no site do Superior Tribunal de Justiça sobre a revisão do Código Penal Brasileiro (3).[3] A importância deste assunto se evidencia também pela realização de diversos eventos (no Brasil e no exterior) (4)[4] e de inúmeros  programas de televisão e rádio que versam o tema (5) [5].

E é este o assunto desta carta: o plágio acadêmico.

Diante de tantas manifestações e como estudante universitária, gostaria de destacar a importância deste assunto para que seja mais divulgado e debatido tanto nas universidades como na Educação Básica, em diferentes contextos: televisão, rádio, sites, eventos científicos, jornais, revistas e outros que sejam adequados.

No dia 21 de junho deste ano, por exemplo, o programa “Sala de Imprensa”, veiculado pela TV ALMG, apresentou um excelente debate sobre o tema “Plágio na Era Digital”. Foi uma ótima iniciativa para divulgar o assunto, embora não seja suficiente. É urgente o comprometimento do poder público diante dos vários casos divulgados.

Tal assunto, a despeito da sua relevância, ainda se encontra limitado a discussões institucionais, hierarquizadas, que pouco ou nada contribuem para que o tema seja eficazmente abordado nas instituições de ensino da Ed. Básica, nas universidades ou em cursos específicos de capacitação docente. O resultado destas iniciativas ineficazes é que estudantes e professores não reconhecem o plágio como crime passível de reclusão e multa que, tendo ocorrido em documentos publicados, pode resultar no seu cancelamento, na perda de títulos e até em demissão.

São inúmeros os casos recentes sobre o assunto que, infelizmente, não conseguiram colocá-lo com o destaque que lhe é devido, ou seja, o da prevenção. Ao ler estes casos, é vergonhoso ver que o plágio tem sido mais utilizado para humilhar e prejudicar professores universitários do que para defender a ética na pesquisa e na educação. Da mesma forma, estudantes de graduação ou pós-graduação são submetidos a humilhações e processados, sem que nenhuma medida educativa seja tomada. Muito menos são feitas avaliações sobre como as instituições formadoras destes estudantes tratam o tema “plágio” nos cursos ofertados.

Temos, assim, uma situação que pode se tornar uma verdadeira “caça às bruxas”, a fim de que trechos plagiados sejam denunciados e uma punição aplicada sem, entretanto, ir à raiz do problema.

Difícil de reconhecer, porém perfeitamente compreensível, é a relação do plágio com a baixa qualidade da Educação nas escolas e universidades brasileiras: baixos salários, carga horária excessiva, pouco tempo para dedicação à formação docente continuada.

Igualmente compreensível é a relação existente entre práticas antiéticas e corrupção (6)[6]: em um país no qual vários representantes eleitos pelo povo se envolvem em situações desonestas e recebem salários astronômicos, contrariamente aos demais trabalhadores assalariados que tem como salário mínimo menos da metade necessária para viver com dignidade e conforto (7) [7], a ética não passa mesmo de um discurso sem a menor importância.

Entretanto, a formação necessária para combater o plágio acadêmico — e outras formas de fraude acadêmica — ou a violação dos direitos autorais inclui, necessariamente, o aprendizado de valores éticos porque estudantes que plagiam não o fazem de uma hora para outra. São anos e anos na Educação Básica e na universidade plagiando textos na sala de aula. Esta conivência de instituições, docentes e discentes cria nas escolas e nas universidades uma aceitação do plágio que praticamente institucionaliza esta prática, atualmente combatida em nível nacional e internacional. Por isso, uma educação que reconhece a importância dos direitos dos autores é imprescindível como medida preventiva de combate ao plágio.

E o Brasil está preparado para combater o plágio: há uma lei que garante os direitos dos autores; há uma associação que cuida da normalização das publicações técnico-cientificas que é a ABNT (Associação Brasileira de Normas e Técnicas); há livros específicos que trazem todas as orientações necessárias para que estudantes e professores aprendam a redigir corretamente diversos tipos de documentos técnico-científicos, desde resenhas simples até teses de doutorado; as grades curriculares dos cursos superiores contém disciplinas cujas ementas contemplam o ensino da redação de textos técnico-científicos; as escolas e universidades contam com bibliotecas que podem emprestar material didático, gratuitamente, sobre o assunto; grande parte da população tem acesso a, pelo menos, um veículo midiático.

Mesmo assim, há um grande desconhecimento por parte da população sobre o tema “plágio” e são muitos os estudantes que sequer possuem um exemplar de um bom manual para normalização de trabalhos escolares e acadêmicos, seja porque não dão importância para este tipo de informação, seja porque não reconhecem estes manuais como um investimento na própria formação (8) [8].

E é esta a realidade de uma Educação que deveria ser de qualidade, dando a oportunidade para que estudantes construam sua própria opinião a partir da leitura de textos de outros autores, respeitando os direitos destes através da utilização de regras simples para referenciar corretamente o material consultado.

Em outras palavras, trata-se de uma prática muito simples que gera consequências muito graves. Atualmente, são comuns as notícias de professores exonerados, estudantes que perderam o título de Mestre ou Doutor, pagamento de multas altíssimas e, em alguns casos, exposição na mídia impressa e virtual. Estes casos colocam em dúvida não somente a qualidade do ensino em instituições tradicionais brasileiras como também a formação ética de seus alunos e professores.

Espero, com esta carta, ter sensibilizado Vossa Excelência para o combate ao plágio, prática que prejudica estudantes e que interfere, diretamente, na qualificação profissional dos mesmos.



Atenciosamente,


Alessandra Belo.
junho/2012



[8] (8) Um excelente manual publicado pela Ed. UFMG não custa mais do que R$50,00 e atende bem estudantes da Ed. Básica ou universitários durante três a quatro anos, ou seja, estudantes adquirem um exemplar no Ensino Médio e um na graduação. Um gasto que pode ser considerado pequeno diante dos benefícios, dentre estes, evitar cometer o plágio.