PLÁGIO, EDUCAÇÃO E RECLUSÃO



Infelizmente, o plágio é um problema recorrente na Ed. Básica e nas universidades. Desde a simples cópia de um conteúdo sem fazer as devidas referências até a compra e venda de trabalhos escolares e acadêmicos, o plágio acontece em níveis diferentes de gravidade.

Esta prática causa tantos problemas que é comum que as pessoas se manifestem a favor da aplicação das punições máximas para quem assume a autoria de uma obra copiada de outra pessoa. E não é para menos: anos e anos de trabalho copiados em cinco minutos, modificando apenas o nome do autor significa realmente uma injustiça.

Entretanto, o plágio não pode ser analisado fora do contexto em que ocorre. Por mais que seja uma grande injustiça, a melhor forma de resolver um problema não é a punição em si mas a compreensão de porque a pessoa está sendo punida e a oferta de oportunidades para aprender a não cometer plágio novamente.

A pergunta é: quando estudantes copiam o conteúdo de livros e artigos sem fazer as referências bibliográficas eles devem ser punidos com expulsão e reclusão? Penso que não: copiar um conteúdo sem fazer a referência, embora erro grave na produção de textos técnico-científicos, não deve resultar nem na expulsão do aluno nem na prisão do mesmo, embora seja a punição prevista por lei. Tenho razões para pensar desta forma.

Primeiro porque a escrita técnico-científica deve ser ensinada nas escolas e universidades e, por isso, quando estudantes cometem plágio isso aponta também para uma falha no próprio sistema de ensino. Logo, se quem é punido é o estudante, o Estado está punindo a pessoa errada...

Segundo, porque a realidade brasileira da educação e do sistema prisional nos leva a evitar a expulsão da escola ou a reclusão como punição, exceto para casos mais graves do que o plágio como a venda de trabalhos acadêmicos, a falsificação de documentos e a alteração de resultados de vestibulares ou de concursos públicos para professores.

Não deve resultar na expulsão do estudante porque no Brasil temos várias políticas inclusivas, que tem como objetivo garantir o acesso de todas as pessoas à educação. A  Constituição Federal prevê que a educação é dever do Estado e da família, direito de todos e obrigatória dos 4 aos 17 anos. Entretanto, a realidade do país mostra que somos 14 milhões de analfabetos absolutos (2012) e 68% das pessoas entre 15 e 64 anos são analfabetos funcionais. (2012). Medidas inclusivas como as políticas de cotas, a construção de unidades escolares, o aumento da oferta de vagas nas universidades (Reuni), a criação de sistemas de bolsas a partir de programas como FIES e ProUni, sem entrar na discussão sobre a eficácia e a forma de implementação de cada uma destas medidas, mostra o esforço do país em garantir a educação para todos. Neste contexto, é extremamente contraditório expulsar um estudante que cometeu plágio. Há outras formas de punição que vão desde a perda de pontos nas atividades que contém plágio até a obrigatoriedade de repetir de ano ou de fazer a disciplina novamente.

Da mesma forma, acredito que a reclusão não seja a melhor forma de lidar com este problema. Mesmo prevista na lei, esta punição dentro do atual contexto brasileiro é demasiadamente exagerada. Primeiro porque, de acordo com dados do Depen/MJ (Departamento Penitenciário Nacional/Ministério da Justiça) há mais presos do que vagas (ver documento 2010 e dez/2011). A superlotação do sistema penitenciário leva à adoção de uma Política Nacional de Penas e Medidas Alternativas.  Em segundo lugar, é exagerada porque a maior parte da população carcerária atual (homens e mulheres) está presa por causa de crimes bem mais graves: entorpecentes, furto, roubo e homicídio (veja as páginas 41 e 42 dos Dados Consolidados do Sistema Penitenciário no Brasil de 2008/2009). Em terceiro lugar, os presídios tem sido frequentemente denunciados por total desrespeito aos direitos humanos, sendo mais parecidos com verdadeiros centros de tortura a céu aberto, onde detentos são maltratados, presos doentes não são assistidos, vivem em péssimas condições de higiene, maus tratos estes que se estendem as famílias dos presos (para saber mais, clique aqui). Inclusive, neste momento no Brasil uma comissão foi instaurada cuidar da reforma do Código Penal Brasileiro.

Logo, uma pessoa que copia um texto e assume a sua autoria, embora esteja cometendo plágio, ao perder sua vaga na escola (que é um local inclusivo) e ir para um presídio (que é um local excludente), traça um caminho que é pior para ela e para a sociedade: sem estudos e estigmatizada como egressa do sistema penitenciário, esta pessoa pode até sair da prisão envolvida com crimes mais graves como tráfico de drogas, por exemplo.

Será mesmo que o plágio cometido nas escolas e nas universidades deve resultar em consequências tão graves? Será que o plágio de textos nas instituições de ensino é crime tão grave quanto o plágio de produtos ou de marcas?

O combate ao plágio nas escolas e nas universidades deveria ser uma medida educativa e a punição serviria para mostrar, para quem plagia, a importância dos direitos autorais, contribuindo para a formação ética destas pessoas, levando sempre em conta a gravidade da situação. Há tantas formas de punir o plágio dentro das instituições de ensino: cursar novamente disciplinas de Metodologia e Pesquisa; repetir a disciplina onde o plágio foi cometido; refazer a  monografia, dissertação ou tese com a possibilidade de perda da bolsa de estudos, se for o caso... É preciso mesmo criminalizar um problema deste dentro das escolas e universidades?


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Perdidos entre o plágio e a originalidade - Valéria Brisolara Salomon


Autoria: Alessandra Belo
2012